Startup cria absorvente biodegradável e aposta em plataforma de saúde menstrual com IA
Com produção feita por mulheres em situação de vulnerabilidade, a EcoCiclo, fundada por três mulheres negras, alia impacto social, tecnologia e sustentabilidade Transformar a falta de acesso a produtos menstruais em um negócio inovador e com impacto social. Foi esse o caminho trilhado por Hellen Nzinga, Adriele Menezes e Patricia Zanella em 2018 ao fundarem a EcoCiclo, especializada no desenvolvimento de absorventes biodegradáveis. Agora, a aposta é uma plataforma de inteligência artificial com previsões sobre o ciclo menstrual. Dessa forma, a empresa pretende unir sustentabilidade, saúde, tecnologia e inclusão em uma frente pouco explorada pelo mercado tradicional.
O ponto de partida para o empreendedorismo foi a própria vivência das sócias. “Crescemos convivendo com a falta de absorventes. A dignidade menstrual sempre esteve no centro da nossa dor e, depois, da nossa solução”, conta Nzinga. Durante o programa de formação ProLíder, elas decidiram que iriam criar um produto com impacto social e ambiental e saíram do zero para construir uma empresa que hoje atende clientes como BlackRock e Rede Mercure.
Um produto pensado para o bem-estar e que vai além
O absorvente desenvolvido pela EcoCiclo é feito com celulose pura, livre de plásticos, metais pesados e fragrâncias artificiais. O material é atôxico, hipoalergênico e se decompõe em até seis meses.
“A gente percebeu que a dignidade menstrual não é só sobre ter acesso ao produto, mas também sobre ter acesso à informação e à saúde. Até quem pode comprar um absorvente está, muitas vezes, usando um produto que faz mal ao próprio corpo”, afirma Nzinga.
A criação do primeiro protótipo foi totalmente artesanal. Sem dinheiro para investir, as sócias ligavam para fábricas pedindo amostras de matéria-prima. Com o material em mãos, entravam em laboratórios de universidades públicas e aprendiam com alunos e professores como desenhar e testar o produto. “Não tínhamos nenhum conhecimento técnico. Um aluno nos ensinou a mexer no AutoCAD para fazermos o primeiro molde”, relembra.
Protótipo do absorvente biodegradável da EcoCiclo
Assessoria
O processo envolveu ainda situações inusitadas, como quando armazenaram uma tonelada de celulose no apartamento da sócia, o que gerou uma confusão no condomínio. “Foi tudo improvisado, mas com muita determinação”, conta a jovem.
Modelo de negócios com impacto
Hoje, a produção do absorvente é feita por demanda, especialmente para empresas, eventos e organizações. O modelo B2B permite planejamento e escala essenciais, já que a EcoCiclo ainda não possui uma indústria própria. Toda a produção é realizada por mulheres em situação de vulnerabilidade, capacitadas pela própria empresa para costurar e confeccionar os produtos.
A marca também oferece calcinhas, biquínis e maiôs menstruais reutilizáveis, que já estão sendo exportados para farmácias na Argentina. Esses produtos são feitos em maior escala e permitem distribuição direta, inclusive em futuras vendas para consumidoras finais.
Outro projeto da empresa é o programa Embaixadoras da Menstruação, que forma terapeutas menstruais em diferentes regiões do Brasil. Cada embaixadora multiplica o conhecimento para ao menos 30 pessoas em sua comunidade.
Projeto de capacitação da EcoCiclo não requer nenhuma experiência prévia
Assessoria
Crescimento com tecnologia e reconhecimento global
Em 2023, as fundadoras receberam o Prêmio da ONU de Inovação com Impacto. Agora, elas dão mais um passo: estão lançando uma plataforma de inteligência artificial gratuita que oferece previsões sobre o ciclo menstrual com base em dados de saúde integral das usuárias — incluindo sono, estresse e alimentação. A iniciativa também poderá servir de base para políticas públicas.
Para viabilizar o crescimento, a EcoCiclo abriu sua primeira rodada de investimento com equity e quer retomar as vendas para pessoa física. “Temos uma comunidade de 17 mil mulheres que nos acompanha. Nosso sonho é estar presente no dia a dia delas com um produto acessível, prático e seguro”, diz Nzinga.
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Apesar do sucesso e reconhecimento internacional, a trajetória da EcoCiclo foi marcada por desafios. “Já pediram para sairmos de reuniões porque o tema incomodava. Já riram da nossa ideia em uma competição de impacto social”, relembra. Além disso, 90% dos investimentos que viabilizaram a empresa vieram de organizações internacionais, especialmente por falta de apoio no Brasil.
Em 2024, a empresa faturou R$ 563 mil e previa atingir R$ 1 milhão em 2025. No entanto, cortes de investidores internacionais fizeram a projeção cair para cerca de R$ 800 mil. Agora, a meta é escalar a produção e disputar espaço com grandes marcas do setor.