Polêmica na praia: dona da Barraca da Denise, famosa no point LGBTQIA+, teme fim de tradição em Ipanema com novo decreto
Barraqueira há 51 anos critica novas regras da prefeitura que proíbem nomes, bandeiras e música; frequentadores e comerciantes temem impactos na identidade e no sustento Aos 78 anos, Aldenice Conceição teme ver sua história apagada. Há 51 anos à frente da Barraca da Denise, em Ipanema, ela viu gerações passarem sob seu guarda-sol. Agora, com as novas regras da prefeitura para as praias do Rio, teme perder o ponto de referência pelo qual é conhecida por clientes de diferentes partes do mundo.
— Concordo que não tenha propaganda. Mas tirar o nome, a bandeira? Isso é demais. A minha barraca é conhecida no mundo inteiro. Como o cliente vai me encontrar? — questiona, com a voz embargada. — Estamos fazendo escada com saco de areia porque falta acessibilidade. Cadê os banheiros químicos?
O decreto da prefeitura, publicado na última sexta-feira, entra em vigor no próximo dia 31 e impõe uma série de proibições nas praias cariocas. São 16 condutas vetadas, entre elas a exibição de nomes e bandeiras em quiosques e barracas, a venda ou distribuição de bebidas em garrafas de vidro, apresentações de música ao vivo, uso de som em geral, cercadinhos com cadeiras na faixa de areia e acampamentos para pernoite.
A medida também proíbe o funcionamento de escolinhas de esporte e atividades recreativas sem autorização, o comércio ambulante irregular, a circulação e o estacionamento de ciclomotores no calçadão e a instalação de estruturas grandes ou fixadas em árvores.
A medida tem causado reação entre trabalhadores e frequentadores da praia. Sandra Ferro, 67, que sai quase todo fim de semana de Nova Friburgo para visitar a Barraca da Denise, não entende a postura do poder público:
— A insegurança no caminho até a praia é o que devia ser prioridade. A orla é a cara do Rio. Dá pra padronizar, mas não apagar o que é nosso. Nome de barraca é identidade.
Poucas horas após a publicação do decreto que impõe novas restrições ao uso das praias do Rio, o prefeito Eduardo Paes adotou um tom firme em encontro com barraqueiros e donos de quiosques no Teatro Ipanema, na última sexta-feira.
— Me perdoem pela dureza, mas esse decreto é meu. Ele ainda está frouxo, precisa de ajustes, mas essa missão é minha. Prefiro perder uma eleição do que ser um prefeito incompetente, com uma cidade esculhambada — afirmou Paes, sem revelar a qual disputa eleitoral se referia.
Em meio à repercussão do decreto, a Câmara de Vereadores do Rio promove nesta terça-feira uma audiência pública para discutir o Projeto de Lei 488/2025, que propõe a criação do Estatuto da Orla do Rio.
De autoria do vereador Flávio Valle (PSD), o projeto busca transformar em lei os princípios do decreto municipal.
— A proposta tem basicamente os mesmos preceitos do decreto, só que é uma lei, portanto, não fica sujeita a uma eventual mudança de entendimento por parte do Executivo. Vamos promover essa audiência pública para ouvir os diversos segmentos da praia e aprimorar o texto — afirma o parlamentar.