O que é fluxo de caixa e por que o controle desse processo pode salvar o seu negócio
Acompanhar o indicador é importante para tomar decisões com base em dados reais Os desafios para quem empreende são enormes. Para os pequenos negócios, então, são ainda mais complicados porque, na maioria das vezes, são “eupreendedores” que tocam a empresa praticamente sozinhos. Isso tem um preço: o relatório “Demografia das Empresas e Estatísticas de Empreendedorismo”, produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no fim de 2024, mostrou que “uma em cada quatro empresas no Brasil não sobrevive ao primeiro ano de existência”. As MEIs não foram consideradas.
Além de aspectos microeconômicos (como formação de preço e comportamento individual do consumidor) e macroeconômicos (como índices de inflação, juros e PIB), pesa no sucesso ou no fracasso de uma empresa a maneira como ela é gerida. O fluxo de caixa, sem dúvida, é um fator que precisa ser observado atentamente porque dele depende a vida ou a morte do negócio.
Fluxo de caixa nada mais é do que o controle e registro detalhado de todas as entradas (receitas/recebimentos) e saídas (despesas/pagamentos) financeiras de uma empresa durante um período determinado. “Ele mostra o ‘saldo’ disponível para operações e investimentos”, resume Samuel Barros, reitor do Ibmec-RJ, especialista em finanças.
Imagine que você precisa controlar sua conta bancária no dia a dia para saber se pode comprar determinado produto agora ou é melhor esperar o mês que vem, quando vai receber o pagamento. Essa ideia, transportada para a realidade empresarial é o que se espera do fluxo de caixa.
“Ele serve para monitorar a liquidez da empresa, evitando problemas financeiros. É útil, ainda, para auxiliar no planejamento estratégico, permitindo decisões bem fundamentadas. A liquidez indica a capacidade da empresa de converter os ativos em caixa para pagar as obrigações, principalmente as de curto prazo”, explica David Kallás, professor do Insper e sócio da KC&D Consultoria.
Para Barros, acompanhar atentamente o fluxo de caixa é importante para tomar decisões com base em dados reais: “Ele ajuda a identificar despesas desnecessárias, facilita o planejamento de curto e longo prazos, avalia a capacidade de pagamento da empresa e evita o endividamento sem necessidade, o que garante a sustentabilidade financeira do negócio”, diz.
Em resumo, empresas que não dão a devida atenção ao fluxo de caixa correm o risco de enfrentar falta de dinheiro para pagar contas recorrentes; de tomar decisões financeiras equivocadas; podem ter dificuldade para obter crédito ou para investir; podem, ainda, ficar inadimplentes e até ir à falência.
Fluxo de caixa na prática
Existem fluxos de caixa distintos e a escolha depende do porte e da complexidade do negócio. “De forma geral, empresas pequenas costumam usar o diário ou mensal; negócios que planejam investimentos utilizam o projetado. O operacional é básico para todos os tipos de negócios e momentos de uma empresa”, resume Samuel Barros, do Ibmec-RJ.
Operacional: registra as atividades principais relacionadas ao negócio – foca nas operações do dia a dia.
Direto: é desenvolvido a partir do registro de todas as entradas e saídas individuais no caixa da empresa. “É semelhante ao que você vê quando acessa o extrato no aplicativo do banco”, exemplifica Kallás.
Indireto: elaborado a partir dos resultados do demonstrativo contábil, efetuando alguns ajustes para sair do resultado competência para o resultado caixa. “Nasce da contabilidade e usa o lucro líquido como base”, informa Barros.
Projetado: é utilizado para montar previsões e movimentações futuras.
Diário/Mensal: faz um controle de curto prazo, ideal para negócios menores ou de alto movimento diário.
Erros mais comuns que comprometem o fluxo de caixa
Misturar contas pessoais às da empresa: “Isso atrapalha a análise e pode trazer implicações ficais danosas”, explica David Kallás, do Insper.
Subestimar despesas: às vezes o empreendedor acaba sendo otimista demais, assume compromissos sem pensar direito, e corre o risco de ficar sem dinheiro para pagar as contas.
Ignorar receitas e despesas sazonais: um exemplo são gastos com mão de obra extra em datas como Dia das Mãs e Natal, para quem tem comércio. Isso impacta o capital de giro. “É importante lembrar que, por mais estranho que possa parecer, crescer consome caixa”, diz Kallás.
Negligenciar a atualização: “Esquecer de lançar movimentações, não projetar os comportamentos de receita e despesa são alguns exemplos”, aponta Samuel Barros.
Deixar de fazer análises periódicas: “Ficar preso na ‘areia movediça’ do dia a dia e não dar atenção a isso implica em não pensar a médio e longo prazos e, eventualmente, deixar de tomar boas decisões”, conclui Kallás.
Leia também
Como monitorar
Dependendo do porte e da complexidade do negócio, há diferentes maneiras de trabalhar com o fluxo de caixa. Para operações mais básicas, planilhas eletrônicas como o Excel resolvem bem. Para as intermediárias, dá para contar com aplicativos específicos para gestão financeira. E, para operações mais elaboradas, os sistemas ERP (Enterprise Resource Planning) ajudam a automatizar todas as transações e a gerar relatórios para análise.
Boas práticas
Dicas para criar um processo eficiente, segundo os especialistas consultados para esta reportagem:
Registre todas as movimentações diariamente, sem exceção;
Utilize categorias claras para despesas e receitas e seja consistente nessa classificação;
Revise despesas com frequência;
Reavalie custos regularmente;
Planeje pagamentos e recebimentos;
Concilie extratos bancários;
Faça análises periódicas e projete cenários futuros;
Tenha um fundo para emergências;
Separe um capital de giro;
Conte com a tecnologia e utilize ferramentas para fazer o registro e o controle.
“Manter a clareza no fluxo de caixa melhora a credibilidade junto a investidores e fornecedores. Ao educar a equipe e adotar disciplina financeira, o empreendedor cria uma base sólida para o crescimento sustentável da empresa”, acredita o professor e consultor David Kallás.