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Empresas centenárias mostram como enfrentam concorrência acirrada para não sair do cotidiano do consumidor

Empresas centenárias mostram como enfrentam concorrência acirrada para não sair do cotidiano do consumidor


Vantagem competitiva da experiência acumulada colabora para que empresas sigam em crescimento por mais de um século
Num setor tão competitivo quanto o varejo, conquistar o consumidor nos corredores de lojas e supermercados e, mais recentemente, no comércio eletrônico é uma tarefa difícil. Mais ainda é fazer isso — e com sucesso — por mais de 100 anos.
É a proeza de companhias centenárias do consumo do cotidiano. O segredo, dizem seus administradores, está em entender que inovação e diversificação não são contrários à tradição.
A reputação é decisiva na escolha dos consumidores, mas conservar essa confiança e, ao mesmo tempo, suprir as novas necessidades do mercado com bons preços são os desafios de companhias longevas de diferentes portes, onde muitas vezes gerações da mesma família se sucedem no comando.
Sobreviver às mudanças e intercorrências é a missão de Ricardo Selmi, representante da quarta geração à frente da empresa que leva o nome de sua família. A Selmi começou como uma pequena produção artesanal de massas há 137 anos em Campinas (SP). Hoje é uma das maiores companhias alimentícias do país. Distribui mais de 170 produtos das marcas Galo e Renata para supermercados de todo o país.
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— Começamos com meu bisavô numa pequena fábrica. A partir dos anos 2000, aumentamos largamente o catálogo e nos tornamos uma empresa de alimentos, e não mais apenas um pastifício. Cada geração investiu nesse crescimento e fez o negócio prosperar. Hoje, tentamos preservar essa história e a confiança do consumidor final — diz o CEO.
Ter o crescimento no horizonte é uma estratégia que vale tanto para marcas que disputam espaço nas prateleiras quanto para os donos delas. No varejo, escala faz diferença. Fundada na cidade do Rio há 132 anos, a Drogaria Pacheco abriu as portas pela primeira vez na Rua dos Andradas, no Centro — em funcionamento até hoje, com características da época preservadas.
De lá para cá, acelerou o crescimento com a fusão com a Drogaria São Paulo e hoje está em nove estados. Ao longo dessa trajetória, viu duas pandemias e duas grandes guerras que abalaram cadeias de produção e logísticas do planeta, bem como atravessou crises internas e períodos de inflação alta.
Experiência é vantagem
Para Jonas Laurindvicius, CEO da rede, ter muito tempo na praça faz diferença, mas é preciso se adaptar às mudanças nas relações de consumo:
— Nossas lojas sempre foram espaços de confiança e acolhimento. Nós nos mantivemos atualizados e acompanhando a evolução dos nossos clientes. Investimos muito para estarmos presentes onde e quando o cliente precisar, na loja física, no site ou no app.
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Diretor da Escola de Negócios da PUC-Rio (IAG), Luís Pessôa observa que, além da boa gestão para se atualizar, o que empresas longevas do cotidiano têm em comum é a vantagem competitiva da experiência em segmentos de concorrência muito acirrada:
— Por estarem há mais tempo no mercado, essas companhias estão num ponto mais adiantado da curva de aprendizado. Têm um acúmulo de know-how em todo o processo, no relacionamento com fornecedores, cadeia logística e consumidores.
Inovar com identidade
Enquanto os anos passam e a marca cresce, o perfil de consumo das novas gerações muda. Por isso, segundo Pessôa, outro fator imprescindível para a resiliência dos negócios é a capacidade de se modernizarem sem a perda dos valores que são a base da empresa.
Fundada em 1917 com duas pequenas fábricas, a Vigor é hoje uma gigante dos laticínios. Para não sair dos carrinhos de compras, apostou na diversificação, muitas vezes como pioneira no lançamento de produtos. Foi o caso do primeiro iogurte natural do país, que lançou em 1940. Também introduziu no mercado as primeiras garrafas de 1 litro da bebida láctea e as combinações com sabores de frutas, orgulha-se o CEO da companhia, César de Los Santos Llamas:
— Como uma trajetória de mais de 100 anos, acreditamos sim que o tempo joga do nosso lado. Mas, ainda que a tradição tenha um papel fundamental, com métodos, conhecimento geracional e receitas únicas, entendemos que a inovação e nossos colaboradores são os ingredientes-chave para a Vigor perdurar por tanto tempo.
Muitas vezes novas tendências forçam um reposicionamento. É o que aconteceu com a Droga Raia, que já contava 106 anos quando se uniu à Drogasil em 2011 para formar a RD Saúde, que hoje soma 1.400 unidades no país. As lojas se transformaram no que a empresa chama de hubs de saúde, onde não há só medicamentos, mas também itens de perfumaria e serviços como exames e aplicação de vacinas.
— Décadas atrás, o farmacêutico era talvez um agente de saúde de alta relevância para o público. Ao longo de décadas, o modelo de negócio das drogarias foi se aproximando mais do comércio. Os hubs resgatam a origem do papel da farmácia. Estamos próximos da população — diz Marcello De Zagottis, vice-presidente de Marketing da RD Saúde.
Quem vê o design moderno das lojas da rede hoje não imagina que a primeira delas, a Pharmacia Raia, foi aberta em agosto de 1905 em Araraquara (SP) pelo imigrante italiano que deu nome à empresa: o farmacêutico João Baptista Raia.
Para Pessôa, da IAG, empresas que sabem cultivar sua história enquanto se modernizam têm mais chance de estabelecer uma relação de confiança com os consumidores:
— A ideia da longevidade passa um atributo de permanência, continuidade, para o consumidor. É como se sinalizasse consistência. E a própria menção da história, da idade, já é uma ferramenta de gestão de identidade, as pessoas veem isso muito bem.
Fundada em 1920, a Laticínios Aviação sabe bem usar a tradição como um ativo, principalmente no marketing. Faz questão de manter o estilo vintage de suas embalagens para que seus produtos logo sejam reconhecidos em padarias e supermercados, como a clássica manteiga em lata.
Mas isso não significa que a empresa não esteja antenada com as novidades do século XXI. Investe, por exemplo, num canal de comércio eletrônico com produtos inspirados na história da companhia. Ali é possível comprar kits de utensílios domésticos e bolsas com as estampas tradicionais de suas embalagens e até um livro que celebra seus 104 anos.
Na fábrica de São Sebastião do Paraíso, no interior de Minas, é possível visitar a “Casa da Manteiga”, que expõe produtos e conta a história da marca.
— Para o aniversário deste ano a loja-modelo vai ser expandida com um Museu da Manteiga, com maquinários históricos, mostrando como era o processo de produção antigamente — diz Maria Paula Queiroz, diretora da Aviação e bisneta de um dos fundadores.
Destaque no setor têxtil
E na hora de acompanhar o pão com manteiga, muita gente toma aquele cafezinho em uma xícara ou mesmo no bom e velho copo americano Nadir Figueiredo, mais uma tradição. A fabricante também é dona de Duralex e Marinex, daquelas marcas de utensílios da qual todo mundo tem algum item em casa e que povoam a memória de diferentes gerações.
Não à toa, é mais um negócio centenário, controlado atualmente por um fundo de private equity que o prepara para ir à Bolsa. Nesta nova etapa de profissionalização, Patrício Figueiredo, sobrinho-neto do fundador, passou recentemente a direção da empresa (que hoje se chama apenas Nadir) para Denis Peres, primeiro CEO fora da família.
Outra categoria comum nas compras regulares dos consumidores é o vestuário. A produção de tecidos e roupas está na gênese da indústria brasileira. Por isso, o setor é um dos que mais acumula companhias centenárias. Só entre as afiliadas da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), 26 têm mais de um século de história.
— O Brasil possui um mercado consumidor interno grande, o que garante demanda constante para os produtos têxteis. Isso foi fundamental para o crescimento das companhias ao longo desse período todo. A tradição gerou conhecimento e expertise que foram transmitidos ao longo das gerações, contribuindo para a longevidade dessas empresas centenárias — diz Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Abit.
Ele continua:
— Não podemos deixar de considerar também que, apesar de não sermos um grande player internacional, as empresas brasileiras do setor têm se internacionalizado mais, levando seus produtos para o mundo.
É o caso da catarinense Karsten, de 142 anos, que começou com uma pequena tecelagem com teares importados da Alemanha para o Vale do Itajaí. Hoje seus produtos chegam a mais de 20 países.
Mudança de rota
Há ainda histórias de negócios que, numa mudança de rumo, apostaram no setor têxtil e deslancharam. É o caso da Lupo, que há 102 anos é referência em meias e moda íntima. A empresa surgiu um pouco antes, em 1902, como uma relojoaria em Araraquara (SP).
Hoje, com uma marca rejuvenescida, vai além da indústria e tem o seu próprio braço de varejo, numa estratégia parecida com outra centenária do setor, a Hering, comprada em 2021 pelo Grupo Soma.
Fundado há 118 anos, o Grupo Malwee era originalmente dedicado ao comércio de queijos e carnes. Os negócios da família Weege foram se expandindo ao longo dos anos, passando por negócios tão diferentes quanto postos de combustíveis e lojas de departamentos.
Em 1968, quando Wandér Weege, da terceira geração da família, formou-se técnico têxtil, surgiu a ideia de concentrar os negócios na indústria têxtil, com a inauguração de uma fábrica unindo malharia, tinturaria, estamparia, corte, costura e expedição. Foi o início do crescimento acelerado do grupo, atualmente um dos principais fabricantes de roupas do país.
Para Guilherme Weege, presidente do Conselho de Administração da empresa, não basta oferecer produtos de qualidade ao comércio. É preciso ajustar a cadeia produtiva para se adaptar às demandas atuais, como a da sustentabilidade:
— Em 100 anos muitas coisas mudaram. E seguem mudando em uma velocidade cada vez maior. As empresas precisam saber se adaptar a essas mudanças tendo clareza dos valores que são inegociáveis.

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