Confeiteira é criticada nas redes por usar IA em post que defende ovo de Páscoa artesanal: ‘Hipocrisia’
Post foi repostado em outras plataformas e já acumula 4,1 milhões de visualizações no X. Especialistas comentam como avaliar se vale a pena entrar em trends do momento A empreendedora Izabella Beatriz, de 24 anos, resolveu entrar na trend das postagens inspiradas nas ilustrações do Studio Ghibli para defender a valorização do trabalho de confeiteiras na produção de ovos de Páscoa artesanais. Embora tenha compartilhado o conteúdo de forma despretensiosa, ela conta que foi surpreendida com a repercussão negativa do post na última terça-feira (8/4). Isso porque um internauta questionou o uso da inteligência artificial e a relação com o posicionamento da confeiteira no X. A publicação já acumula 4,1 milhões de visualizações e 84 mil curtidas.
“Compre ovos de Páscoa de uma confeiteira (é muito mais gostoso). O ovo de Páscoa artesanal é melhor que o de mercado”, dizia o texto das imagens. No X, usuários apontaram como “ironia” e “hipocrisia” e questionaram por que ela não teria contratado um artista para desenhar o post.
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À frente da confeitaria Sobra Doces, que mantém com o namorado Eduardo Ribeiro, 24, a empreendedora costuma compartilhar a rotina de trabalho e divulgação dos produtos ofertados pela marca nas redes sociais, incluindo a venda de cursos online para a comunidade.
Diante do alcance da publicação, ela conta que a ideia do post era comunicar a mensagem que já é defendida por ela desde a abertura do negócio, em 2020. Além disso, Beatriz diz que só participou da trend para engajar sua rede social, já que as ilustrações viralizaram nas últimas semanas. O sucesso foi tanto que celebridades e autoridades também aderiram ao viral. A hashtag #studioghibli, por exemplo, reúne mais de 3 milhões de publicações no Instagram.
A confeiteira ainda explica que a foto usada para gerar a ilustração já havia sido publicada em fevereiro deste ano, bem como outras imagens incentivando a valorização do segmento.
“A gente sempre defendeu no nosso perfil que as confeiteiras precisam se valorizar, pois muitas trabalham e acabam ficando no prejuízo. Falo muito que a confeitaria não é só por amor, é preciso dinheiro para se manter, os insumos são caros. Então, sempre fizemos conteúdos com essa proposta”, afirma.
Apesar das críticas, o casal conta que recebeu apoio dos seguidores, que compartilharam as imagens. Eduardo Ribeiro, que administra as redes do negócio, ressalta o intuito positivo da publicação e critica a “tentativa de perseguição aos pequenos negócios”.
“Entramos na trend para ajudar na divulgação da Páscoa e para fazer com que a comunidade se sentisse valorizada e acolhida. Sempre fizemos fotos da Izabella segurando as plaquinhas com frases e aproveitamos a oportunidade desse alcance”, diz.
Ele ainda reforça o aprendizado adquirido nesta experiência e o compromisso com o crescimento da empresa. “Recebemos comentários que nos deixaram assustados, foi a primeira vez que algo desse tipo aconteceu. Tudo isso nos deu essa consciência e não faríamos de novo”, relata.
Negócio começou com venda de brigadeiros
Em outubro de 2020, a confeiteira precisou encontrar uma forma de se manter e transformou a venda de doces em negócio. Para isso, ela investiu R$ 50 para iniciar a produção dos brigadeiros nas ruas da cidade de Sobradinho, no Distrito Federal.
“Tive que sair de casa por conta de alguns problemas e não consegui arranjar emprego. Aí resolvi vender os brigadeiros na rua porque gostava de comer e fazer doces, mas não foi fácil”, lembra.
Embora tenha enfrentado dificuldades para atrair a clientela, o negócio foi se profissionalizando com o tempo e persistência dos jovens. Em 2021, o casal decidiu criar o perfil da Sobra Doces nas redes sociais e passou a ter mais visibilidade. Nesse momento, eles focaram nas encomendas e vendas em plataformas de delivery, como o iFood.
Como forma de ampliar a receita do negócio, o casal resolveu investir na venda de produtos digitais e lançou o primeiro e-book focado em dicas de confeitaria no ano de 2022. “Colocamos tudo que sabíamos sobre a produção de brigadeiros, as nossas receitas, as técnicas. Tudo isso porque muita gente começou a pedir dicas para nós”, diz.
Depois do e-book, o casal desenvolveu os cursos e já atingiu mais de 1 mil alunos. Atualmente, a empresa promove o produto voltado para as receitas de ovos e lembranças de chocolate. Além disso, a marca atende os clientes em datas sazonais por meio de encomendas, entre elas destacam-se a Páscoa e o Natal. A partir da maior oferta de produtos, o casal chegou a faturar mais de R$ 6 mil por mês.
Como avaliar se vale a pena entrar em trends das redes sociais?
Fernanda Picosse, diretora jurídica e fundadora da IpLatam Marcas e Patentes, explica que as trends podem funcionar para alavancar o alcance dos negócios nas redes sociais. No entanto, a proposta deve ser avaliada com cautela pelos envolvidos, considerando a atração de um público mais amplo. Além disso, a especialista alerta para a importância de não infringir leis e diretrizes relacionadas à proteção dos direitos autorais, por exemplo.
“Empreendedores devem ser cuidadosos para evitar violações de direitos autorais ou uso não autorizado de imagem de terceiros. No caso de trends inspiradas em obras específicas, como as do Studio Ghibli, é crucial assegurar que o conteúdo não infrinja direitos autorais”, aponta.
Ela ainda diz que o uso de tecnologias como a inteligência artificial nas publicações pode afetar negativamente a percepção de autenticidade e originalidade da marca. “Os consumidores podem questionar a originalidade e a confiabilidade do produto final. Para uma confeitaria, usar imagens como portfólio requer que os clientes sintam confiança de que os produtos reais correspondem à representação visual. É importante comunicar claramente ao público sobre o uso de IA”, acrescenta.
Lyana Bittencourt, CEO do Grupo Bittencourt — consultoria especializada em redes de negócio — corrobora que a participação em trends virais deve estar alinhadas aos valores e contexto do negócio para alcançar resultados efetivos. Caso haja repercussão negativa, ela ressalta a importância de estratégias para gerenciar a crise.
“É importante ouvir o que o público está dizendo, avaliar se a crítica tem fundamento e responder com empatia, clareza e transparência, explicando a intenção por trás do conteúdo”, recomenda.
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O que é a trend inspirada no Studio Ghibli?
As redes sociais foram tomadas na última semana por ilustrações no estilo da animação do estúdio japonês Ghibli. A trend, que consiste em usar a inteligência artificial para transformar fotos, foi seguida por milhares de usuários, entre eles perfis oficiais de autoridades, famosos e anônimos.
Apesar do sucesso na plataforma, o cineasta japonês e co-fundador do Studio Ghibli, Hayao Miyazaki, já reprovou o uso de IA na animação em um vídeo divulgado em novembro de 2016. A discussão ocorreu durante uma reunião do estúdio. Ao assistir uma das cenas no telão, ele define a prática como ‘insulto à própria vida’ e demonstração de que estávamos ‘perto do fim dos tempos’. O registro já soma mais de 1,6 milhão de visualizações no YouTube.